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Senadores debatem novo regime fiscal estabelecido pela PEC do Teto de Gastos

Por mais de cinco horas, os senadores se revezaram em discursos no Plenário para debater a PEC 55/2016 (PEC 241/2016 na Câmara dos Deputados). O texto, encaminhado ao Congresso pelo governo Temer, foi aprovado em primeiro turno e segue na pauta do Plenário, onde passará por mais três sessões de discussão e mais um turno de votação.

Para os defensores da chamada PEC do Teto de Gastos, o novo regime fiscal é condição fundamental para a retomada do crescimento econômico do país e para o ajuste, além de diminuir a possibilidade de retorno da inflação. Os senadores que apoiam a proposta também afirmaram que o novo regime não define um teto para gastos com saúde e educação, mas sim um piso, e ajudará a reduzir a pressão por aumento da carga tributária e impedir o crescimento da dívida bruta brasileira. Argumentaram também que as áreas de saúde e educação poderão receber recursos acima da inflação, desde que haja economia em outras áreas.

Já os senadores críticos à PEC argumentaram que o novo regime fiscal acarretará redução dos gastos públicos em saúde e educação em relação aos atuais mínimos constitucionais e  impedirá o aumento real do salário mínimo. Além disso, os senadores contrários à proposta afirmaram que haverá redução global dos investimentos públicos e comprometimento da reposição da inflação nos salários dos servidores públicos e de novos concursos. Também afirmaram que as mudanças vão impedir que o governo aja para aumentar investimentos em momentos de desaceleração econômica. E não tocam no atual modelo tributário, apontado como injusto.

Contas públicas

O relator da PEC 55/2016, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), afirmou que o novo regime fiscal vai “revolucionar dramaticamente a forma como o Brasil tratará as contas públicas durante os próximos anos”. Segundo ele, países como Estados Unidos, Suécia, Finlândia e Holanda também equilibram suas contas públicas por meio do controle de gastos.

Eunício disse que as despesas primárias do governo cresceram 5,7% por ano entre 1997 e 2015, acima do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, o desequilíbrio fiscal brasileiro “tem origem no aumento continuado da despesa primária”. Ele acredita que o teto de gastos permitirá a “manutenção dos gastos públicos em termos reais”.

Para o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), a necessidade de aprovação da PEC mostra que os governos do PT aumentaram sem controle as despesas públicas durante os últimos anos, o que fez crescer o endividamento do país, a corrupção e a inflação. Na opinião de Caiado, “os orçamentos do PT eram peças de ficção”. Ele também afirmou que os governos petistas contingenciaram bilhões de reais da educação e da saúde na última década.

Assim como Caiado, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) afirmou que programas como o Programa Universidade para Todos (ProUni) não serão prejudicados. Aloysio Nunes acusou os governos do PT destruírem a indústria brasileira e de colocar o Brasil “na maior crise econômica dos últimos 120 anos”.

O senador Hélio José (PMDB-DF) disse que o ajuste fiscal é necessário. Segundo o senador, a PEC não diminuirá investimentos em áreas sociais e pode fazer o Brasil voltar a crescer, gerar empregos e “ter obras de Norte a Sul”.

Racionalidade

Para Lúcia Vânia (PSB-GO), a PEC é necessária porque o país enfrenta a pior crise dos últimos e não tem objetivo de reverter ou substituir as políticas sociais garantidas na Constituição. Ela defendeu a “racionalidade administrativa” e novo paradigma fiscal estabelecido pela PEC, com o fim da chamada contabilidade criativa.

Ao manifestar seu voto favorável à PEC dos gastos, Cristovam Buarque (PPS-DF) criticou a “euforia” que dominava a equipe econômica do governo do PT até que se chegasse ao que o senador considera uma tragédia na gestão pública.  Para ele, o que está em jogo não é o aumento salarial dos professores, mas a garantia do pagamento do salário.

— Não voto com entusiasmo, mas por necessidade, para evitar o afundamento. Como se fosse o presidente de uma empresa pedindo concordata aos seus credores. O Brasil está em concordata. Esta é a PEC do óbvio, não é do teto, por que não dá para gastar mais. Eu voto para que o Brasil respire e para que nós façamos orçamentos sérios — disse Cristovam.

Para o senador José Agripino (DEM-RN), uma motivação para votar a favor da PEC é a relação dívida/PIB. Segundo ele, se a PEC não for aprovada, essa relação vai chegar a 90% daqui a três anos e levar o país ao calote da dívida pública, com graves consequências. Ele disse que a PEC, ao contrário do que alega a oposição, é totalmente a favor dos pobres e a favor do Brasil.

— Eu não estou votando a favor do governo, eu estou votando a favor do meu país — afirmou Agripino.

Arrecadação

Para Cidinho Santos (PR-MT), é óbvio que o governo não pode gastar mais do que arrecada. O senador contestou os argumentos de que a crise é menos grave do que se diz. Ele sugeriu uma reforma trabalhista para incentivar as empresas e a geração de empregos.

O senador Reguffe (sem partido-DF) disse que, quando um governo gasta mais do que arrecadou, que acaba pagando a conta é o contribuinte, por meio do aumento de impostos. Ele declarou voto favorável à proposta, mas apoiou a realização de um referendo popular em 2017 para que a população diga se concorda ou não com a PEC. Ele também sugeriu ao governo economizar recursos diminuindo o número de cargos comissionados e terceirizados e reduzindo os gastos com publicidade.

— Um governo não pode gastar mais do que arrecada — disse Reguffe.

Romero Jucá (PMDB-RR) afirmou que as altas taxas de desemprego, o aumento da dívida publica e a taxa de juros elevada não são responsabilidade de Temer, que está no governo há apenas seis meses. Jucá afirmou que foi o governo petista que gastou desenfreadamente e que a PEC é urgente e inadiável.

— Esse é apenas o discurso de quem estava há pouco tempo no governo e não resolveu o problema da saúde, da educação, nem dos juros e da dívida — declarou Jucá.

Ele também argumentou que a PEC não impedirá o aumento real do salário mínimo. Segundo afirmou, o que cortou esse aumento foram três anos de governo sem crescimento do PIB. Jucá destacou ainda que não é verdade que a PEC cortará salários ou prejudicará a saúde e educação.

O senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) ressaltou que não há alternativa para solucionar o grave problema econômico que está acarretando desequilíbrio fiscal e inúmeros desempregos no país. Segundo ele, a carga tributária do Brasil já está muito alta e a dívida pública estrondosa, não sendo possível aumentar nenhum dos dois.

Arrocho

Já a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) afirmou que a PEC vai tirar dinheiro da educação e da saúde e que os maiores prejudicados serão os mais pobres. Ela desafiou os demais senadores a diminuírem os próprios ganhos antes de promoverem tamanho arrocho para a população brasileira. A senadora pediu que seus colegas votem três projetos: o que reduz em 20% os salários dos senadores, o que acaba com o caráter vitalício do plano de saúde dos senadores e o que diminui em 10% a verba de gabinete.

Gleisi Hoffmann acrescentou ainda que diversas entidades e organizações enviaram comunicados ao Congresso contra a aprovação do teto de gastos, entre elas, a Confederação Nacional dos Municípios, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Conselho Nacional da Saúde (CNS), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Fiocruz, Procuradoria Geral da República (PGR) e outras.

Em resposta, Reguffe lembrou que, em seu primeiro dia de mandato como senador, ele abriu mão do plano de saúde dos senadores, diminuiu a própria verba de gabinete, desistiu da chamada verba indenizatória e reduziu o número de funcionários a que tem direito.

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) afirmou que a maior parte dos senadores não participou de nenhuma audiência pública promovida sobre o tema nem dos debates em Plenário. Ela reafirmou que saúde e educação perderão mais de R$ 200 milhões cada uma com o novo regime fiscal. Para ela, o caminho correto para o ajuste fiscal seria taxar as grandes fortunas e cobrar tributos de dividendos, por exemplo.

Recessão

Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que a queda do resultado primário nos últimos anos foi devida, em grande parte, à queda da arrecadação e não apenas ao aumento das despesas. De acordo com ele, país algum promoveu o “congelamento da estrutura de bem-estar social de um Estado nacional”. Para ele, o teto de gastos vai aprofundar a recessão e diminuir investimentos públicos em saúde e educação. Para reduzir gastos, Randolfe sugeriu que os senadores aprovem a PEC 106/2015, que reduz o número de deputados e senadores.

O limite de despesas por 20 anos, segundo a senadora Ângela Portela (PT-RR), também vai congelar a crise, além de não garantir a retomada do crescimento. Na visão da senadora, a PEC compromete a educação e a saúde e impede o avanço de áreas como a assistência social, os direitos humanos e a segurança pública. Ela ainda criticou o pouco debate sobre o assunto e advertiu que a PEC também diminuirá os investimentos nas ações de diminuição das desigualdades regionais.

Juros

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), chamou de “capenga” o ajuste fiscal do governo por eliminar despesas sem trabalhar a receita, comprometendo o estímulo a investimentos e ao crescimento nos próximos 20 anos. Para o senador, os pobres é que vão pagar pelo ajuste, uma vez que serão afetadas apenas as despesas com gastos sociais positivos, enquanto os juros permanecerão como estão.

A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) apontou os prejuízos que a PEC pode trazer para a educação.  Ela receia uma queda no percentual mínimo de 18% estabelecido na Constituição.

— Com essa redução drástica de recursos, nós veremos em breve escolas fechando e isso é um crime de lesa-pátria. A PEC 55 interdita o futuro da educação da nossa juventude porque vai jogar na lata do lixo as metas do novo Plano Nacional de Educação, de mais escolas técnicas, de mais ensino superior e valorização do magistério — afirmou Fátima Bezerra.

Para Lídice da Mata (PSB-BA), a PEC é antidemocrática por impor aos próximos presidentes do Brasil a mesma política fiscal adotada pelo atual governo. A senadora também acusou o presidente Michel Temer de trair o programa para o qual foi eleito como vice da então presidente Dilma Rousseff. Ela apoiou o referendo para consultar o povo sobre as mudanças.

Golpe

Lindbergh Farias (PT-RJ) classificou a PEC como uma "continuidade do golpe". Para ele, a ideia não era só tirar a presidente da República do poder, mas também retirar direitos sociais e trabalhistas da população enquanto os ricos continuam com os mesmos privilégios. O senador disse considerar que a PEC significa rasgar a Constituição e o voto popular das próximas eleições.

— Eu pergunto de que vale agora eleger um presidente da República se o presidente eleito pelo povo não vai poder fazer a política que combinou com o povo no seu programa, não vai fazer política anticíclica, não vai poder investir mais em educação e saúde. Isso é inconstitucional — declarou Lindbergh.

O senador João Capiberibe (PSB-AP) sugeriu medidas alternativas para reverter a crise. Para ele, não há mais o que cortar em saúde e educação, mas poderia ser feita uma auditoria na dívida. Além disso, o senador sugeriu a recriação de um imposto sobre lucros e dividendos, que poderia arrecadar R$ 64 bilhões em 2016, e a taxação de grandes fortunas.

— Não é possível sair do atoleiro penalizando os mais pobres — argumentou Capiberibe.

O senador Roberto Requião (PMDB-PR) afirmou que a PEC, em um curtíssimo prazo, levará o país a uma crise social sem limites. Segundo ele, o Congresso não tem interesse em refletir e aprofundar as causas nacionais e internacionais da PEC 55 e os votos dos parlamentares já estariam “negociados”.

— A maioria dos senadores não se interessa mais em debater a PEC. Já está tudo acertado — criticou Requião.

Vinculação de recursos

Por sua vez, José Pimentel (PT-CE) ressaltou que, se é verdade que a proposta não retira dinheiro da saúde e educação, o trecho que suspende os efeitos dos artigos que vinculam recursos para essas duas áreas na Constituição poderia ser retirado da proposta.

— Nós temos o direito de fazer escolhas para tirar o país da crise econômica, mas existem outras escolhas. O que não é justo é que seja, exclusivamente, os mais pobres que vão pagar essa conta – disse Pimentel.

O senador Paulo Paim (PT-RS) disse que nenhum país adotou uma medida como a PEC do Teto dos Gastos. Ele informou que recebeu manifestações de vários setores do Judiciário, do Ministério Público, da OAB e da CNBB com posições contrárias ao texto. Paim ainda citou pesquisa realizada pelo site do Senado, em que 23 mil internautas votaram a favor e 343 mil se manifestaram contrários à PEC.

— A quem interessa essa PEC? — questionou Paim.

A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) considerou 20 anos um prazo muito longo e desnecessário para o teto de gastos. Conforme disse, o ajuste fiscal não é apenas técnico e contábil, pois vai impactar as vidas de milhões de brasileiros. Em sua opinião, os senadores estão abrindo mão de umas das principais prerrogativas do Congresso Nacional, que é a elaboração e manejo do Orçamento da União. Ela mostrou um gráfico que mostra que a dívida bruta do governo federal teve trajetória descendente nos governos Lula e no primeiro governo Dilma.

Diversos outros senadores também participaram dos debates, entre eles Ataídes Oliveira (PSDB-TO), José Medeiros (PSD-MT), Ana Amélia (PP-RS), Paulo Bauer (PSDB-SC), Ricardo Ferraço (PSDB-ES), Magno Malta (PR-ES), Sérgio Petecão (PSD-AC), Aécio Neves (PSDB-MG), Ivo Cassol (PP-RO), Telmário Mota (PDT-RR), Waldemir Moka (PMDB-MS), Valdir Raupp (PMDB-RO) e José Aníbal (PSDB-SP), todos favoráveis à aprovação da PEC. Ainda falaram contrários à proposta, entre outros, os senadores Paulo Rocha (PT-PA) e Regina Sousa (PT-PI).