O Congresso Nacional aprovou na madrugada desta quarta-feira (24) o texto principal da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano de 2017 (PLN 2/2016). Foram 252 votos favoráveis e 8 contrários entre os deputados, além de obstrução promovida por parlamentares da oposição, que não votaram. Entre os senadores, a votação foi simbólica. Ficaram pendentes de votação três destaques.
O texto autoriza o governo federal a fechar o ano com um déficit de R$ 139 bilhões e prevê um crescimento de 1,2% no produto interno bruto (PIB). Caso se confirme a estimativa da lei, o Brasil completará quatro anos consecutivos de déficit fiscal e, consequentemente, de crescimento da dívida pública nacional. Além do rombo previsto a nível federal, o projeto antecipa déficits de R$ 1,1 bilhão para estados e municípios e de R$ 3 bilhões para as estatais.
A previsão do déficit foi uma alteração promovida pelo presidente interino, Michel Temer, em relação ao texto original do projeto da lei, que falava em resultado fiscal zero (nem superávit e nem déficit). As bancadas de oposição ao governo interino tentaram resgatar essa proposta através de um destaque, mas não tiveram sucesso.
Outros indicadores trazidos pelo texto para o próximo ano incluem a previsões de inflação de 4,8%, taxa de juros de 11,25% e preço do dólar a R$ 3,81.
“Realismo”
O relator da LDO, senador Wellington Fagundes (PR-MT), destacou que o projeto aprovado pelo Congresso tem como principal mérito ser “realista”. Segundo ele, essa característica pode ser alcançada porque o texto conta com dispositivos que obrigam o governo federal a limitar as suas despesas e trabalhar com uma arrecadação concreta.
— Longe de ser uma tábua de salvação, o projeto procura retratar o Brasil de hoje. Nossa realidade fiscal indica um perfil de muitas dificuldades. Não adianta incluir no texto despesas que não serão executadas. Isso gera frustração na sociedade e desvaloriza o papel do orçamento e do parlamento — afirmou o relator.
A LDO de 2017 estipula que os gastos primários da União no próximo ano não sejam superiores aos de 2016 (incluindo os restos a pagar), corrigidos pela inflação oficial. Essa limitação é tema de uma proposta em tramitação na Câmara dos Deputados (PEC 241/2016).
Além disso, a lei contém dispositivo proibindo que o Executivo inclua na previsão de receitas da Lei Orçamentária Anual (LOA) a arrecadação com impostos cuja criação ainda não tenha sido aprovada pelo Congresso. O governo deve enviar o projeto da LOA até o fim de agosto.
Devido a essa proibição, Wellington Fagundes retirou da LDO a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), tema que já era discutido como saída para melhorar a arrecadação. O senador tem defendido que o governo federal busque formas de sanar as contas públicas sem novos impostos. Alternativas que ele propõe são a elevação de alíquotas de tributos já existentes, privatizações e concessões.
“Desastre”
A inclusão do dispositivo de limitação de gastos na LDO foi alvo de muitas críticas dos parlamentares que se opõem à PEC 241. O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que a medida levará ao corte de dezenas de bilhões de reais de setores como educação, saúde, segurança e moradia.
— A antecipação do que apregoa essa PEC é o prenúncio de um desastre que o país vai sofrer. Vai levar o Brasil a um gravíssimo processo de recessão econômica e de disputa selvagem pelos recursos públicos limitados que temos. Um crescimento meramente nominal das despesas sociais é mais do que um erro, é um crime — disse o senador.
Humberto Costa também destacou que incorporar a limitação de despesas sem antes aprovar a PEC com essa previsão tornaria a LDO inconstitucional. Além disso, observou que a proposta dá ao Congresso a prerrogativa de decidir a respeito dos cortes e direcionamentos das despesas, e, em sua opinião, isso beneficia corporações de ofício que exercem pressão sobre os parlamentares, em detrimento da sociedade não-organizada.
Deputados também criticaram o dispositivo. Luciana Santos (PCdoB-PE) declarou que essa é uma iniciativa rumo ao “desmonte do Estado brasileiro” e à “desnacionalização”. Edmilson Rodrigues (PSOL-PA) classificou a proposta como uma “expressão da perversidade”, e pediu audiências públicas sobre a LDO antes da apreciação pelo Plenário.
A oposição apresentou destaque para retirar do texto da lei a limitação de gastos, mas ele não foi aprovado.
Obras e investimentos
Wellington também destacou a preocupação da LDO com a questão das obras públicas paralisadas ou não concluídas no prazo. O senador explicou que seu relatório trouxe uma série de medidas para amenizar o problema de empreendimentos federais iniciados com planejamento insuficiente e que excedem o tempo e o orçamento previstos para conclusão.
— Hoje fala-se em 20 mil obras, mas na verdade o governo não tem um relatório especificado. Nem o governo federal tem condições de afirmar e de mostrar para a sociedade esse volume. Eu sempre tenho dito que uma obra inacabada causa muito mais prejuízo à população, porque não serve para nada e custa para manter. A retomada de uma obra vai, com certeza, despender um recurso público muito grande — disse o relator.
A medida mais imediata sugerida pela LDO é que o Executivo passe a priorizar, em seus investimentos de infraestrutura, as obras que estejam pelo menos 50% concluídas. O projeto prevê também a criação de um cadastro público, na internet, de obras federais orçadas a partir de R$ 50 milhões, para que possa haver constante acompanhamento da sociedade.
O relator sugere ainda que todas as obras orçadas em pelo menos R$ 10 milhões tenham projeto executivo e estudo de viabilidade técnica e econômica; e que o Executivo não possa mais fazer convênios para novas obras com municípios que ainda tenham empreendimentos inacabados da mesma natureza.
Wellington também chamou a atenção para a definição de um piso para investimentos federais em infraestrutura no ano de 2017. Pela proposta da LDO, esse montante não poderia ser inferior ao valor investido em 2016, acrescido da inflação anual.
Três destaques relativos ao texto principal da lei não foram votados por falta de quórum, e serão apreciados na próxima convocação do Congresso. Um deles trata das possibilidades de livre remanejamento de despesas do orçamento pelo Executivo, dispositivo que a oposição quer retirar. Os outros dois são equivalentes e retiram da previsão de contingenciamento as verbas destinadas a ciência e tecnologia.
Auditoria
Na sua reunião desta manhã, em que concluiu a votação da LDO, a Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO) incluiu no texto a realização de uma auditoria na dívida pública no próximo ano. A proposta foi mantida pelo Plenário, mas ainda precisará ser confirmada pelo presidente interino, Michel Temer. A LDO de 2016 incluiu uma auditoria, mas o dispositivo foi vetado pela presidente afastada, Dilma Rousseff.
A iniciativa foi resultado de emenda do deputado Edmilson Rodrigues (PSOL-PA), e propõe a auditoria no âmbito do Ministério da Fazenda com a participação de órgãos federais, como o Tribunal de Contas da União (TCU), e de entidades da sociedade civil. Ela foi bem recebida pelo relator.
— Toda a população brasileira sempre cobra [saber] quanto o Brasil paga e qual é a origem da dívida. Hoje o orçamento é usado basicamente para rolagem da dívida e pagamento de juros, ou seja, sobra muito pouco para o investimento — explicou Wellington Fagundes.
Foto: Moreira Mariz/Agência Senado